sexta-feira, 25 de abril de 2014

Senna

"Nada é justo, e pouco é certo.

Que estamos destruindo o futuro e a 

maldade anda sempre aqui por perto"*


            Em 1994, quando Senna morreu, esperamos o caixão vir da Itália como se fosse um parente muito próximo. Como se fosse alguém muito íntimo e especial para cada de um nós. E de fato o era.
           Mas hoje tudo isso ainda me parece um fato curioso.
           Senna nunca foi pobre. Ao contrário, ele estudou em boas escolas e teve muitas oportunidades na vida. Teria um futuro brilhante e uma carreira bem sucedida em qualquer profissão que escolhesse, de certo, e acabou por escolher ser piloto de carro. Era bonito, jovem, fazia sucesso entre as mulheres e não conhecia a miséria de seu país de perto como a maioria de nós. Entretanto [todavia, contudo, porém] foi amado pelo povo assim mesmo. Era ele o inverso do "perfil" brasileiro e mesmo assim encontramos nele algo para nos identificarmos. 
            Há muitos anos a miséria é explorada com muita competência pela mídia brasileira; quanto mais pobre, humilhado, necessitado e excluído, maior o destaque que uma pessoa tem. É comum ver uma mesma história, uma mesma origem triste e amargurada precedendo a carreira de muitos artistas, celebridades ou esportistas. Mas com Senna era diferente. Ele fugia exatamente desse padrão e, justamente por isso, acabou por quebrar a regra geral de sofrimento e a estúpida exaltação da tragédia. 
            Minha surpresa permanece até hoje, 20 anos após o seu desaparecimento, acerca dos atributos de sua personalidade, suas crenças e seu estilo competitivo. Um ídolo brasileiro que não exaltava suas possíveis misérias do passado, não chorava lágrimas em programas dominicais de TV, e superava obstáculos monumentais que ele mesmo se impunha. Um ídolo, como já disse, que mostrava uma "parte boa" do Brasil. Uma "parte boa" que nós nem sabíamos que existia. Uma parte que morreu há 20 anos atrás.







*[trecho de "Clarisse" - Legião Urbana]